Mulher, mãe, esposa e cientista: essa é a Dra. Giselle Pinto de Faria Lopes, vencedora, pela segunda vez, do Prêmio “Soberania Pela Ciência”. Nesta última edição, foi premiada pela autoria do artigo “Percepção Pública das Algas Marinhas e suas Aplicações em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação”.
Movida pelo nobre desejo de encontrar a cura para o câncer, escolheu a Biomedicina como profissão. Como Pesquisadora Titular do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM) — cuja missão é realizar atividades de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) no ambiente marinho, contribuindo para o melhor conhecimento e uso eficiente do mar em alinhamento com os interesses da Marinha do Brasil (MB) — a cientista direcionou seus estudos para contemplar as duas principais vertentes de pesquisa da Instituição, atuando em dois grandes projetos na linha de “Produtos Naturais Marinhos”.
Nesta entrevista, a Dra. Giselle compartilha sua trajetória, os desafios enfrentados, os sonhos que a movem e as conquistas que marcaram sua carreira, além de sua dedicação à comunidade científica e à MB. Confira!
Agência Marinha de Notícias (AgMN): Professora Giselle, como começou sua trajetória na área de pesquisa marinha? Sempre teve essa vocação?
Dra. Giselle Faria Lopes: Comecei em 1999, ao escolher a graduação no Curso de Formação de Pesquisadores da UFRJ, que mais tarde passou a se chamar Biomedicina. Sempre quis ser cientista. Durante 20 anos, atuei no Instituto Nacional de Câncer (INCA) e, desde o meu primeiro estágio de iniciação científica, estudo a biologia das células cancerosas, seu perfil de resistência à quimioterapia e estratégias que utilizam plantas como fonte de produtos naturais com potencial anticâncer. No final de 2018, fui acolhida pelo Departamento de Biotecnologia Marinha do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM), onde tenho a oportunidade de estudar o potencial dos produtos naturais marinhos não somente como agentes anticâncer, mas também como fontes de antídotos e suplementos.
Agência Marinha de Notícias (AgMN): Como foi sua chegada à Marinha/ao Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM)? Que lembranças guarda dos primeiros anos?
Dra. Giselle Faria Lopes: Fui extremamente bem acolhida pela Dra. Eliane Gonzalez, diretora em 2018, e pelo Dr. Ricardo Coutinho, meu chefe imediato e responsável pelo Departamento de Biotecnologia Marinha. Ambos perceberam o potencial biotecnológico que eu poderia desenvolver na Divisão de Bioprodutos, especialmente considerando minha experiência na área da saúde.
Agência Marinha de Notícias (AgMN): Durante sua formação acadêmica, enfrentou desafios ou momentos que a fizeram repensar seu caminho?
Dra. Giselle Faria Lopes: Sempre digo aos meus alunos que ser cientista no Brasil é para quem realmente ama o que faz, porque não é fácil. Há momentos em que repensamos a carreira. O Brasil está cheio de doutores muito qualificados, mas o mercado não consegue absorver todo mundo. Fiz mais de vinte concursos públicos, lutando por uma única vaga para chegar em meu cargo atual.

Agência Marinha de Notícias (AgMN): Houve alguém ou alguma experiência que tenha sido especialmente inspiradora para a senhora seguir na pesquisa científica?
Dra. Giselle Faria Lopes: Meus pais. Minha mãe era uma professora muito criativa, e meu pai é um engenheiro muito curioso. E não posso esquecer do meu marido, co-autor do estudo, pois diariamente ele me ensina a cultura militar e discute comigo as possibilidades de pesquisas na área da Defesa (grifo da entrevistada). Devo a eles toda minha inspiração e experiências de vida que me permitiram escolher e viver nesse mundo da ciência.
Agência Marinha de Notícias (AgMN): Ao longo de sua carreira no IEAPM, em quais áreas a senhora mais atuou e quais projetos considera mais desafiadores?
Dra. Giselle Faria Lopes: No IEAPM temos que ser multidisciplinares. Mantenho minha linha de pesquisa em produtos naturais anticâncer desde que cheguei, usando modelos pré-clínicos, e devo em breve desenvolver um projeto mais completo de Bioprospecção Oncológica inspirada nos tipos de câncer mais incidentes na família naval. Lidero dois grandes projetos: o Superalimento, que utiliza tecnologia de algas e células para suplementação alimentar, e o Antídoto Natural Marinho, que considera estratégias de fontes naturais marinhas contra diferentes ameaças químicas e biológicas. O projeto mais desafiador foi adaptar meus conhecimentos técnicos utilizados na área da saúde para os projetos relacionados ao estabelecimento de parâmetros de diagnóstico ambiental de derramamento de óleo — uma oportunidade de colaborar com pesquisadores do Departamento, bem como de outras universidades e áreas do conhecimento.
Agência Marinha de Notícias (AgMN): A senhora acredita que a atuação no IEAPM contribuiu para transformar sua visão sobre o mar e os desafios da ciência marinha?
Dra. Giselle Faria Lopes: Com certeza. Quando cheguei aqui, não tinha nem a metade do conhecimento das atividades da área de ciências do mar, que é imensa, e com isso apresenta desafios proporcionais a essa área. O IEAPM está localizado em uma região muito estratégica e tem uma equipe de pesquisadores muito experientes que “nasceram” com o Instituto, que completou 41 anos recentemente. Por exemplo, a parte de bioprospecção, há vários desafios porque envolve a parte prática “fora do laboratório” como o mergulho e conhecimento da área alvo no mar, a morfologia, o desenvolvimento e a fisiologia, além das associações ecológicas e químicas entre os organismos até os testes de bioprodutos com potenciais farmacológicos e alimentares da minha área de atuação, sem considerar outras áreas estudadas aqui também.
Agência Marinha de Notícias (AgMN): Como vê hoje o papel da mulher na ciência, especialmente em áreas estratégicas como as pesquisas oceânicas?
Dra. Giselle Faria Lopes: Acho que, de uma maneira geral, a participação das mulheres tem sido cada vez mais destacada nas pesquisas em todas as áreas. Há cada vez mais oportunidades de financiamento para projetos voltados ao empoderamento feminino, com abordagens multidisciplinares.
Agência Marinha de Notícias (AgMN): Que projetos ou linhas de pesquisa pretende fortalecer ou iniciar em breve dentro do Instituto?
Dra. Giselle Faria Lopes: Os projetos atuais que lidero (Superalimento e Antídoto) são temas de linhas de pesquisa extensas que estão resultando em diferentes desdobramentos. Além disso, como citei anteriormente, pretendo consolidar ainda este ano um projeto de bioprospecção oncológica e fortalecer o conhecimento nesta área de câncer, tema essencial para a família naval e a sociedade, que é a minha especialidade.

Agência Marinha de Notícias (AgMN): A senhora foi agraciada duas vezes com o Prêmio “Soberania pela Ciência”, concedido pela Marinha do Brasil, sendo a última edição marcada pela presença da Ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação. Que tipo de reconhecimento representa para sua trajetória profissional e pessoal?
Dra. Giselle Faria Lopes: Isso me mostra que estou no caminho certo. Não pesquiso vislumbrando tal reconhecimento, mas quando acontece, não tenho como não ficar extremamente agradecida, são momentos marcantes que só a Marinha promove. Eu, por exemplo, entrei na faculdade querendo “curar o câncer”. Percebi ao longo desses 25 anos que não é uma tarefa fácil, mas o estímulo e a certa “ingenuidade” ou “ousadia” dessa intenção persiste e passo isso para meus alunos: podemos ajudar com um tijolinho nessa construção conhecida como conhecimento científico e tecnológico, e, quem sabe no futuro, ajudar a humanidade.

Agência Marinha de Notícias (AgMN): Receber duas vezes uma premiação tão importante reforça ainda mais sua contribuição para a ciência marinha. Que mensagem gostaria de deixar para as futuras gerações de cientistas que também sonham em fortalecer a soberania do Brasil por meio da pesquisa?
Dra. Giselle Faria Lopes: Que continuemos resilientes e curiosos, pois a solução está no mar!
Comentários
Excelente!!! Que bom que possuímos profissionais desse porte, ainda mais sendo premiada e reconhecida pela Marinha do Brasil, por seu trabalho!!!!
Parabéns a todos os envolvidos!!! Muito orgulho de vocês!!!
Parabéns à Marinha do Brasil, motivo de orgulho.
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