No ano em que o fim da Segunda Guerra Mundial completa 80 anos, militares da Marinha do Brasil (MB) obtiveram os primeiros dados batimétricos (que englobam posição e profundidade) do antigo Navio-Auxiliar (NA) “Vital de Oliveira”, torpedeado em 1944 pelo submarino alemão U-861. O ataque causou cerca de cem mortes.

As informações foram coletadas durante a comissão “Testes de Mar e Comissionamento”, do atual Navio de Pesquisa Hidroceanográfico “Vital de Oliveira”. A descoberta do casco do navio naufragado deu-se na manhã do dia 16 de janeiro,  a 35 milhas náuticas (cerca de 65 quilômetros) do litoral de Macaé (RJ) e contou com o auxílio de mergulhadores locais.

Detalhes da operação

Segundo o arqueólogo da Divisão de Arqueologia Subaquática da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha (DPHDM), Capitão-Tenente (T) Caio Cezar Pereira Demilio, que participou da comissão, o levantamento obteve dados para a análise da posição, estado, conservação e características estruturais da embarcação. “A localização e a documentação do naufrágio foram conduzidas utilizando ecobatímetro multifeixe e sonar de varredura lateral, equipamentos fundamentais para levantamentos hidrográficos e arqueológicos, principalmente no ramo da Arqueologia de Naufrágios”, relata.

O ecobatímetro multifeixe foi empregado para mapear o relevo do fundo oceânico, uma vez que é capaz de medir a profundidade em vários pontos ao mesmo tempo. Seu uso permite a criação de modelos tridimensionais, fornecendo um espectro sobre a integridade e a disposição do naufrágio. Já o sonar de varredura lateral gerou imagens acústicas de alta resolução, possibilitando a visualização detalhada do casco e de outros elementos estruturais do naufrágio. No total, durante a operação, foram realizadas 32 linhas de sondagem com o ecobatímetro multifeixe e 9 linhas de varredura lateral, cobrindo uma extensa área ao redor do local do naufrágio.

A identificação e o estudo de sítios arqueológicos subaquáticos são importantes para diversas áreas, como Arqueologia, História, Antropologia e até mesmo Engenharia Naval. “Naufrágios e outras estruturas submersas são registros materiais da história marítima do Brasil. Essas evidências permitem compreender rotas comerciais, estratégias navais, avanços tecnológicos e episódios como confrontos militares e desastres marítimos. Em alguns casos, as embarcações naufragadas estão associadas a períodos específicos, como a Segunda Guerra Mundial, o que adiciona relevância estratégica e diplomática ao seu estudo”, detalha o Capitão-Tenente (T) Demilio.

A descoberta do local de naufrágio do NA “Vital de Oliveira” foi realizada, a princípio, pelos irmãos mergulhadores José Luiz e Everaldo Pompermayer Meriguete, ao atenderem o chamado de um pescador cuja rede havia ficado presa ao fundo. Eles então pediram o auxílio de Domingos Afonso Jório, mergulhador de grandes profundidades, que identificou que a rede estava presa em um canhão e avisou o fato à Marinha.

Próximos passos da pesquisa

As informações obtidas durante a comissão serão processadas, a fim de criar modelos tridimensionais do naufrágio. “Esses modelos permitirão uma avaliação detalhada das condições estruturais remanescentes e da relação da embarcação com o ambiente”, explica o Capitão-Tenente (T) Demilio.

Além disso, atividades como mergulhos técnicos e o uso do veículo subaquático operado remotamente (ROV) poderão ser conduzidas, para captura de fotografias e vídeos, bem como para a coleta de dados adicionais sobre o material da embarcação e eventuais artefatos associados ao naufrágio. Do mesmo modo, a ampliação do mapeamento também será de fundamental importância para um conhecimento mais robusto sobre o fato. “O estudo será integrado ao projeto ‘Atlas dos Naufrágios de Interesse Histórico da Costa do Brasil’, iniciativa voltada para a identificação e catalogação de embarcações naufragadas ao longo do litoral brasileiro”, detalha o arqueólogo. Ele acrescenta que esse processo vai permitir que seja feita a correlação entre diferentes sítios arqueológicos submersos, e também contribuir para um entendimento mais amplo da história marítima do País.

Passado e presente se encontram

O fato de os dados terem sido coletados em comissão do Navio de Pesquisa Hidroceanográfico “Vital de Oliveira”, homônimo da embarcação naufragada, reveste a ocasião de especial simbolismo. Ambos os meios navais foram batizados em homenagem ao Capitão de Fragata Manoel Antônio Vital de Oliveira, Patrono da Hidrografia. O militar foi morto em combate, em 1867, durante a Guerra do Paraguai, quando era comandante do Monitor Encouraçado “Silvado”.

O NA “Vital de Oliveira”, construído em 1910 e originalmente chamado de “Itaúba”, foi incorporado à MB em 1931. Permaneceu ativo até ser torpedeado, na noite de 19 de julho de 1944, pela Marinha Alemã, tornando-se o único navio militar brasileiro a ser naufragado por forças inimigas durante a Segunda Guerra. Na ocasião, aproximadamente cem de seus cerca de 270 tripulantes foram mortos. Sua atuação no conflito deu-se, principalmente, no transporte de militares e suprimentos ao longo da costa brasileira.

Já o atual Navio de Pesquisa Hidroceanográfico “Vital de Oliveira”, embora tenha função diferente de seu antigo homônimo, também presta apoio a atividades essenciais da MB.  Entre elas, estão a execução de levantamentos hidroceanográficos, a realização de coleta de dados ambientais e o apoio a pesquisas científicas em áreas marítimas de interesse.
 

Divisão de Arqueologia Subaquática

A Divisão de Arqueologia Subaquática da DPHDM é responsável pela pesquisa, preservação e divulgação do patrimônio cultural submerso em águas brasileiras. Para esse fim, seus militares atuam com base na aplicação de metodologias científicas para a identificação, documentação e análise de sítios arqueológicos subaquáticos.

Para além de realizar pesquisa científica, catalogação e mapeamento, a divisão mantém parcerias institucionais com universidades, centros de pesquisa e organizações internacionais, e promove atividades para o público. Exposições, publicações e materiais educativos voltados para a valorização do patrimônio submerso são essenciais a fim de aguçar a mentalidade marítima da população brasileira. A participação da sociedade é estimulada inclusive na comunicação de descobertas, como a acontecida no caso do NA “Vital de Oliveira”, com o fim de subsidiar o Atlas dos Naufrágios, que se encontra disponível neste link.

“A atuação da Divisão de Arqueologia Subaquática reforça o papel da Marinha do Brasil na preservação do patrimônio histórico subaquático, assegurando que vestígios da história marítima sejam documentados e estudados de forma sistemática e acessível”, conclui o Capitão-Tenente (T) Demilio.

Comentários

Domingo Afonso Jório (não verificado) Sex, 31/01/2025 - 18:43

É gratificante ver a Marinha do Brasil resgatando esta parte importantíssima da nossa história. A história não é exatamente só nossa, mas mundial e a contribuição certamente terá repercussão mundial.
Parabéns aos militares que conduziram e conduzirão a continuidade das operações.
Continuem publicitando o fato.

Edivan S. De O… (não verificado) Sáb, 01/02/2025 - 08:26

Em verdade, o agradecimento deve-se ao senhor, Domingo Afonso Jório, as técnicas de mergulho e o a curiosidade levaram ao fato, a Marinha do Brasil dará segmento a relevante descoberta do senhor.

Ricardo Freitas (não verificado) Sáb, 01/02/2025 - 09:25

Não consegui saber a profundidade que os restos da embarcação se encontram...
Falha minha ou do texto?
...ou a marinha não quer divulgar?

Alexander Pere… (não verificado) Dom, 02/02/2025 - 07:38

Acessei o post procurando exatamente esta informação, que me parece bem relevante.

Julio Flávio R… (não verificado) Dom, 02/02/2025 - 12:02

Segundo O Globo, o navio repousa a 55 metros de profundidade.

Vicente De Luca (não verificado) Qui, 06/02/2025 - 13:42

Pq a Marinha do Brasil não divulgaria a profundidade? Após oitenta anos, o fato e suas decorrência já se tornaram de domínio público. Belo trabalho Marinha, em q pese as limitações orçamentárias
"Tudo pela Patria".

MARCOS ANTONIO… (não verificado) Sáb, 01/02/2025 - 19:14

Meu pai foi náufrago desse navio
Marinheiro João Antônio da Silva

Vicente De Luca (não verificado) Qui, 06/02/2025 - 13:44

Nossas respeitosas reverências ao seu Pai

Departamento d… (não verificado) Ter, 11/02/2025 - 10:20

Boa tarde,
Aqui falo pelo Departamento de História da Diretoria de Patrimonio Histórico e Documentação da Marinha. Agradecemos a mensagem, e temos interesse em saber mais sobre o seu familiar que estava no navio.
Se puder, encaminhe um e-mail para: dphdm.historia@marinha.mil.br
Aguardamos o seu contato!

Carlos Alberto… (não verificado) Seg, 03/02/2025 - 01:26

Meu tio foi náufrago desse navio. Contou como aconteceu. Marinheiro Cezar Martins. Excelente trabalho desa equipe de pesquisa

Departamento d… (não verificado) Ter, 11/02/2025 - 10:20

Boa tarde,
Aqui falo pelo Departamento de História da Diretoria de Patrimonio Histórico e Documentação da Marinha. Agradecemos a mensagem, e temos interesse em saber mais sobre o seu familiar que estava no navio.
Se puder, encaminhe um e-mail para: dphdm.historia@marinha.mil.br
Aguardamos o seu contato!

CRISTOVAO FERR… (não verificado) Qua, 05/02/2025 - 07:23

Parabéns a todos os envolvidos nesta importante descoberta. Que os fatos vindouros, a repeito, continuem sendo reportados.

Joelma pomperm… (não verificado) Sex, 07/02/2025 - 22:56

Meus irmãos José Luís (Luizinho) e Everaldo Pompermayer Meriguete que descobriram a localização num dia de trabalho de por serem pescadores. E entregamos a localização para marinha. Fico muito feliz em agora termos a oficialização da Marianna e justamente por um navio com Mesmo nome desse navio afundado por um torpedo.

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