O Brasil, por meio de sua representação permanente na Organização Marítima Internacional (IMO), participa da 82ª Sessão do Comitê de Proteção ao Meio Ambiente Marinho (MEPC-82), que ocorre até amanhã (4). A delegação brasileira, liderada pela Marinha do Brasil (MB), tem intensificado as discussões sobre a transição energética no mar, um dos principais temas debatidos nesta Sessão.

O debate sobre a transição energética tem se intensificado nos últimos dias, por ocasião da 17ª Reunião do Grupo de Trabalho Intersessional sobre a Redução de Emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) por Navios, realizada entre 23 e 27 de outubro, e a 82ª Sessão do Comitê, iniciada em 30 de setembro.

“Os próximos três anos serão decisivos para a definição de novos padrões mundiais para o transporte marítimo, com a definição de critérios para os combustíveis de zero ou baixa emissão, que serão utilizados pelos navios, bem como a adoção de mecanismo de precificação que os tornem competitivos, quando comparados aos combustíveis atuais. Tais definições resultarão em significativos impactos econômicos, que serão sentidos em diferentes intensidades, conforme as características de cada país”, explicitou o Encarregado da Divisão de Coordenação para os Assuntos da IMO, pertencente à estrutura do Estado-Maior da Armada, Capitão de Mar e Guerra Paulo Roberto da Costa Barros.

A IMO é a Agência Especializada das Nações Unidas, sediada em Londres, que tem por missão a promoção de um transporte marítimo internacional seguro, protegido e ambientalmente eficiente e sustentável, por meio da cooperação técnica. Para cumprir sua missão, estruturou-se com cinco comitês temáticos dedicados à segurança marítima (MSC), à proteção do meio ambiente marinho (MEPC), à facilitação do tráfego marítimo (FAL), à cooperação técnica (TCC) e aos assuntos legais (LEG). Possui, ainda, sete subcomitês que atuam para atender às demandas desses comitês.

Considerando o volume dos trabalhos, os comitês e subcomitês poderão estabelecer Grupos de Trabalho (WG) durante as sessões, Grupos por Correspondência (CG) ou Grupos de Trabalho Intersessionais (ISWG).


A Estratégia da IMO 

Em julho 2023, o MEPC adotou a “Estratégia da IMO para a Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa por Navios”, principal instrumento daquela organização para cumprir sua atribuição de adotar medidas para reduzir as emissões de GEE no mar, como previsto desde o Protocolo de Kyoto, de 1997.

A Estratégia prevê a adoção de medidas de curto, médio e longo prazos, bem como a implementação de medidas técnicas (tecnologias e medidas de controle que reduzirão as emissões) e econômicas (mecanismo de precificação das emissões). As medidas de curto prazo foram discutidas, adotadas e implementadas no período de 2018 a 2022, consistindo em requisitos técnicos e operacionais destinados a reduzir a intensidade das emissões em pelo menos 40% até 2030, em comparação aos níveis de 2008.

No campo das medidas técnicas, como medidas de longo e médio prazo, estão em debate os critérios voltados à seleção de combustíveis de baixa ou zero emissão que sejam capazes de atingir os níveis de ambição propostos na Estratégia de 2023 (referenciados aos níveis de 2008):
- Diminuir a intensidade de carbono em pelo menos 40%, até 2030;
- Alcançar 5% (buscando 10%) de navios que utilizem tecnologias com zero ou baixa emissão de GEE, até 2030; e
- Atingir “zero emissões”, por volta de 2050, considerando o cômputo “líquido” (equilíbrio entre os gases lançados e os capturados na produção e consumo).

O acompanhamento do alcance desses níveis se dará com o monitoramento de checkpoints indicativos, em 2030 e 2040, ocasiões em que se estima: redução de 20 a 30% do total de emissões em 2030 e diminuição de 70 a 80% em 2040.

No campo das medidas econômicas de médio e longo prazo, duas principais propostas estão em discussão: a adoção de uma taxação linear por emissões (Levy Tax), apoiada por países europeus e pequenos países insulares, ou a adoção de um mecanismo flexível de taxação, ou recompensa por emissões acima, ou abaixo de um padrão esperado de decréscimo até 2050 (International Maritime Sustainable Fuel & Fund – IMSF&F), defendido por Brasil, China, Emirados Árabes Unidos e Noruega, dentre outros.

Em ambos os casos, os recursos a serem arrecadados comporão um fundo destinado ao desenvolvimento de novas tecnologias e a ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, com foco nos países menos desenvolvidos (Least Developed Countries - LDC) e nos pequenos estados insulares em desenvolvimento (Small Island Developing States – SIDS).

Discussões

As medidas técnicas a serem adotadas se basearão em uma Avaliação do Ciclo de Vida (Life Cycle Assessment – LCA) dos combustíveis candidatos à transição energética, cujos critérios são delineados em diretrizes discutidas pelo MEPC. Esse trabalho está em andamento, observando-se a atuação dos Estados-membros da IMO em blocos de interesse voltados a privilegiar alguns tipos de combustível em detrimento de outros.

Os biocombustíveis, por exemplo, vêm sendo combatidos por um grupo formado por países europeus, SIDS e LDC, sob a alegação de que a sua produção concorreria com a produção de alimentos, sem contribuir efetivamente para o alcance dos níveis de ambição. Tais argumentos não deveriam prosperar ao considerarem a realidade desses países, os quais não dispõem de terras agricultáveis disponíveis para a produção.

O Brasil, por sua vez, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), dedica apenas 8% do seu território para a produção de alimentos. Estudos daquela empresa indicam a existência de mais de 28 milhões de hectares de pastagens plantadas com níveis de degradação intermediário e severo e outros 11 milhões de hectares de pastagens com degradação severa, com potencial agrícola. Toda essa área poderia ser revertida para o aumento da produção agrícola, incluindo os biocombustíveis.

No campo das medidas econômicas, semelhante embate está ocorrendo entre esses grupos, com o Brasil defendendo a adoção do IMSF&F. A solução alternativa (taxação linear) seria potencialmente prejudicial aos países que possuem mercados consumidores distantes, como o Brasil, pois competidores situados em locais mais próximos naturalmente emitiriam menos, sendo menos taxados, o que tornaria seus produtos mais econômicos.

A delegação brasileira presente à sessão do MEPC, coordenada pela Marinha, conta com o apoio do Ministério das Relações Exteriores (MRE) e da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), dentre outros representantes dos setores público privado (empresas, associações e academia) e têm conduzido intensos debates voltados a defender em plenário os interesses nacionais relacionados à questão da transição energética no mar, de modo que ela ocorra de modo justo, com impactos econômicos igualmente distribuídos entre os países.

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